Depois de alguns goles de vodka,
que cortavam a fumaça do seu cigarro e entre poucas lágrimas que insistiam em
cair, finalmente concluiu a última frase de seu texto, escrito a lápis, para
permitir que o tempo, a seu tempo, apague tudo o que for necessário. Foram
poucas páginas, doze no total, mas com uma intensidade peculiar de quando o
passar das horas tem o dobro da velocidade habitual diante do abismo das
memórias. Isso o fez rever muita coisa e buscar o significado de várias outras,
mesmo que essa fosse uma tarefa de custo-benefício não muito favorável para se
viver o presente.
Continua sua revisão e se sentiu dotado de um certo poder
porque em poucos movimentos, conseguia corrigir ou melhorar situações passadas.
Apenas no papel. Houveram momentos que extrapolaram o sorriso no rosto, alguns
que abriram feridas em sua pele e outros que apenas o alertavam que respirar é
a maior riqueza que possa existir. Mas eis que chega a hora e o propósito de
sua escrita. O ponto final. Destino de toda trajetória, por mais errante errada
que seja. Desde o começo tudo fora arquitetado para esse minuto, no qual a
redenção de uma vida pode se concretizar. Já havia cumprido seu papel e doou o
que tinha para oferecer. A consciência de ter aproveitado esse legado ou não,
depende da perspectiva vigente em cada sentença.
Levantou de sua cadeira, deixou
a porta de sua casa entreaberta pela ultima vez, atravessou a rua e com poucos
passos estava na praia. Não havia mais como retroceder. Aceitou que o fluxo da
vida é uma constate inconstância, mudanças de cenários, e saídas de personagens,
para que outros possam brilhar. E lá na areia que refletia, no pouco espaço que
tinha, o brilho da lua de quase meia noite, uma multidão foi cúmplice de sua
decisão, por inteira. O estampido foi quase ensurdecedor. Seus pedaços voaram
por toda parte e provocou uma catarse, gritaria coletiva. Mais um que se
despede para entrar na história de todos, quer aceitem ou não. Seu nome é 2013.
Cedo ou tarde ele veio, se foi e deixou um filho, 2014, para perpetuar a
geração de um dom, sofrido mas apesar de tudo, feliz. A vida.